Foto falida #5 – O rastro do foguete nas auroras boreais
No mês passado tive a oportunidade de ir à Nova Zelândia para participar de um congresso sobre tecnologias espaciais para pesquisa em florestas. Desde 2012 uso imagens de satélite aplicadas à pesquisas ecológicas e já pude participar do mesmo evento no Chile há oito anos atrás. De lá pra cá as coisas mudaram bastante, com muitas novas tecnologias e novos satélites em operação, coletando dados o tempo todo ao redor do globo.
Dentre os milhares de satélites orbitando o planeta neste momento, há dois que são de extrema importância desde o início do século e que estão perto de se aposentar. Os satélites Terra e Acqua, projetados para durarem menos de dez anos, já estão em funcionamento por mais de duas décadas e, carregando o mesmo sensor, fornecem dados essenciais para estudar o funcionamento de ecossistemas em larga escala.
Na conferência de abertura do congresso, a Professora Crystal Schaaf, responsável pelo gerenciamento de todas as imagens geradas pelos sensores a bordo do Terra e do Acqua nos contou todo o histórico de desenvolvimento dessas duas missões, e seu envolvimento pessoal com elas.
Talvez o momento mais esperado e crítico de qualquer missão espacial seja o lançamento dos foguetes que carregam os satélites. Para a professora Schaaf, no entanto, o momento do lançamento do Terra, o primeiro dos dois satélites, foi o mais emocionante de sua vida. Até mais emocionante do que o parto de sua filha, quem a professora levou para assistir ao lançamento do Acqua dois anos mais tarde.
Foi engraçado ouvir as histórias sobre lançamentos de foguetes, pois já tive uma experiência com eles também. Mas, ao invés de estar profissionalmente envolvido em uma missão espacial, estava me preparando para fotografar auroras boreais nas ilhas Vesteralen, na Noruega, há exatos dois anos.
O arquipélago é um dos melhores lugares do mundo para ver as auroras, pois sua localização permite boas condições de tempo e, portanto, céus noturnos sem nuvens que possibilitam ver o fenômeno. E, pelo mesmo motivo, a ilha de Andøy abriga um centro de lançamento de foguetes de pequeno porte, chamado Andøy Space Centre.
E aqui peço licença para reproduzir um trecho do diário da viagem, pois o tempo passado desde então não me permitem lembrar os detalhes da baita foto perdida.
“O plano daquela noite era fotografar na praia, mas tinha obra na pista e um caminhão trancando […]. Finalmente vi que o bloqueio da pista (que também vi na noite anterior quando cheguei) tinha acabado. Recolhi tudo e fui pra Bleik. Na verdade, pro mirante onde queria só contemplar um pouco, sem fotografar. Passando pelo Andøy Space Centre, vi duas torres que não estavam lá durante o dia. O que será que eram? Parei no mirante só pra curtir um pouco a noite.
Mas as auroras estavam bem fortes e bonitas, baixas no céu na direção norte, e não me contive. Precisei ir buscar os tripés e as câmeras no carro. Enquanto uma câmera estava no tripé no chão e eu montava a outra, chegou uma viatura, com as luzes piscando e encostou atrás de mim. Desceu um viking enorme, com os braços do tamanho da minha coxa. Careca, barbudo, brincos na orelha.
-Você não pode ficar aqui.
Gelei. O que tinha feito de errado?
-Do you understand?
-Yes.
-Ok, So, you can`t stay here. You need to go either to Bleik or Andenes.
Antes que eu pudesse perguntar o motivo…
-We are going to launch a rocket
-Wow! Is it possible to see???
-Yes, you can see it from anywhere, even from behind the mountain.
Que?! Iam lançar um foguete!
[O viking] foi pro outro carro [que estava na mais à minha frente] e conversou em noruegues com os que estavam lá dentro. Esperei um pouco até ele voltar e perguntei de onde seria melhor pra ver. Ele repetiu que de qualquer lugar daria pra ver, mas me disse que de Andenes, voltando pela estrada, virando a esquerda e logo a próxima esquerda dava pra ver tudo.”
A estrada não estava fechada por obras, mas sim por segurança da base de lançamento. Então, voltei para a cidade e fiquei algumas horas monitorando a situação a partir de uma praia. Duas câmeras montadas no tripé, vendo a base de lançamento preparada e as auroras não paravam de brilhar. Minha expectativa de ser uma bela foto era simplesmente enorme, com o rastro do foguete e as auroras no fundo. Mas o tempo passou, a estrada foi liberada, as torres de lançamento foram baixadas e, para minha decepção, a missão foi abortada naquela noite. Fiz muitas outras fotos, mas sonhei com os foguetes. Estava um pouco decepcionado de ter perdido uma oportunidade como aquela e, por alguns momentos, pensei até que haviam lançado e eu que não tinha visto.
Na tarde seguinte, saí da minha cabana um pouco mais cedo do que o de costume, pois ia viajar mais longe para fotografar a noite. Eu estava exatamente atrás da montanha que o viking tinha comentado e, logo ao sair, vi uma luz. Pensei ser um caminhão longe na estrada. A luz veio acompanhada de uma explosão. Fiquei sem entender nada. À explosão seguiu um barulho muito alto. Olhei pra cima… e lá estava ele, subindo ao infinito.
De repente, outro clarão, outro barulho e outro foguete. Assim como Terra e Acqua separados por dois anos, vi o lançamento de dois foguetes separados por vinte minutos. Mesmo detrás da montanha, posso dizer que foi espetacular. E só depois que eles sumiram no céu foi que tive a ideia de tirar as câmeras da mochila. Já era tarde. Fiquei um pouco triste de saber que a partir de então, as possibilidades de fazer minha foto do foguete com as auroras real e literalmente tinham ido pro espaço.
Escrevi no diário: “Uma mistura de alegria e decepção quando veio outro clarão, outro estrondo e… outro foguete! Esse vi inteiro, desde o desacoplamento de um dos estágios até ele desaparecer no infinito […] Eternizo esse momento com palavras. E com uma reportagem da NASA“.
“Mais um sonho realizado, mas sem foto. Preciso retornar pra fazer essa.”