Tierras Yermas
Projeto de curta duração
Situação: Completo
Período: 2022-2023
Formato: impresso (em preparo)
De passagem por Navarra (Espanha) em 2018, ouvi falar sobre um “deserto” nas proximidades, mas que o acesso não era muito favorável para visitação. Poucas coisas me fascinam tanto quanto o mar e, uma delas, são os desertos. Estes podem parecer antíteses – a abundância e a completa escassez de água – mas para os humanos, a água salgada também é um deserto. E é por isso que me intrigam, me atraem e têm o meu respeito.
Naquela época, não fui capaz de visitar o tal deserto em Navarra, mas nunca deixei de pensar nele. De volta à Espanha quatro anos depois, já havia feito pesquisas suficientes para ter certeza de que iria lá na primeira oportunidade: ao “deserto” de Bardenas Reales. Em minhas pesquisas, descobri que não se tratava de um deserto, mas de terras áridas (badlands), o que não diminuiu seu encanto. E, graças a isso, também descobri outras regiões similares na Península Ibérica, com as mesmas características geológicas e paisagísticas, que passaram a integrar este projeto.
A principal característica dessas paisagens de terras áridas é a grande concentração de cânions, desfiladeiros, ravinas, canais e chaminés de fadas, ou seja, colunas de rocha com uma camada mais sólida em seus picos que protege toda a coluna da erosão. Essa topografia acidentada ocorre em todos os continentes, exceto na Antártica, e é formada ao longo de milhares ou milhões de anos por uma combinação de três fatores principais: chuvas escassas, mas intensas; pouca cobertura vegetal devido ao clima árido ou semi-árido, e; solo impermeável na superfície, mas frágil e facilmente erodido pela água.
Ao ver todo esse terreno erodido, não consigo deixar de pensar como serão a Caatinga, o Cerrado, a Amazônia ou os Pampas se toda a pressão agrícola intensificar a perda de solo e, em alguns casos, desencadear processos mais intensos de desertificação. A beleza das chamadas terras áridas reside no fato de serem naturais, assim como os campos sulistas dos Pampas, a floresta branca da Caatinga, as savanas e as florestas tropicais.
No entanto, a “fórmula” para a criação de terras áridas (para a desertificação) está sendo gradualmente aplicada à risca em várias regiões do Brasil, onde os solos são naturalmente frágeis, mas o clima era ameno e a vegetação exuberante. A combinação de mudanças climáticas e desmatamento no Brasil poderia resultar em paisagens áridas nas próximas décadas – verdadeiras tierras yermas, como as representadas aqui – mas ocupando o lugar dos ecossistemas mais biodiversos do mundo.
Este projeto não pretende ser uma representação instantânea do presente, nem que no futuro funcione como uma memória documental do passado. O objetivo deste ensaio é ser um retrato de um futuro árido e desértico que está cada vez mais próximo no ritmo atual de destruição dos ecossistemas tropicais.
La tierra yerma, sin árbol
ni montaña, el cielo seco,
huérfano de nube o pájaro;
tan quietos los dos, tan solos,
frente a frente tierra y cielo,
paralelismo de espejos,
que ahora no hay lejos ni cerca,
alto o bajo, mucho o poco,
en el universo,
¡Dulce muerte de medidas,
guiño de infinito!
Pero de un surco se vuelaun pájaro primerizo.
Y todo vuelve a ordenarse
por la pauta de su sino.
Ya la tierra está aquí abajo
y el cielo allí arriba puesto,
ya la llanura es inmensa
y el caminante pequeño.
Y ya sé lo que está lejos:
dicha, gracia, paz o logro.
Y ya sé lo que esta cerca:
el corazón en el pecho.
Pedro Salinas, 1923
Análise crítica por LensCulture
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Dentro de sua beleza e poesia visual, as imagens expressam uma profunda preocupação com essas terras. Há um senso de envolvimento pessoal no trabalho que faz com que o público queira acompanhar você nesta jornada.
Em um nível técnico, parece que você sabe bem o que fazer com o formato monocromático para trazer aquela estética distinta até o limite, sem se tornar excessivamente dramático. Sombras e destaques em suas imagens não são apenas qualidades visuais da luz; são dispositivos narrativos que permitem que as formas visuais obtenham conteúdo e significado. A falta de cor também define a abordagem, afastando-a da representação literal e documentação do assunto sem cortar o vínculo com a realidade. O formato monocromático, conforme você o tratou, sugere uma interpretação poética do território que você investiga, uma espécie de memorialização, assim como fez Ansel Adams para o Parque Nacional de Yosemite. Não é que você apresente essas montanhas somente como monumentos, mas os gestos e texturas distintos criam um senso de importância e emergência sobre o futuro deste lugar.
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